segunda-feira, 26 de abril de 2010

GOVERNO PLANEJA SOLTAR 20% DOS PRESOS DO PAÍS

O Globo

Depois de longos debates no 12º Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal, em Salvador, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) decidiu elaborar um projeto de monitoramento eletrônico que pode resultar na soltura de cerca de 80 mil presos, quase um quinto da população carcerária brasileira.
O monitoramento poderá ser feito pela tornozeleira eletrônica, que permite saber a localização de quem a usa. O governo entende que o controle de criminosos de baixa periculosidade fora das cadeias é uma das poucas alternativas para desafogar os presídios no país. O número de detentos aumenta a uma taxa de 7,3% ao ano, e, para o Depen, não há investimento em ampliação da estrutura prisional que dê conta da demanda.
Benefício poderá ser estendido a condenados A cada ano, o déficit carcerário aumenta em quatro mil vagas, e a tendência é a deterioração do quadro, já crítico, mesmo com o crescente aporte de recursos federais. Pela proposta em estudo, o monitoramento eletrônico poderia beneficiar presos provisórios (sem condenação) que não tenham posto em risco a vida ou a integridade física das vítimas. O diretor do Depen, Airton Michels, entende que o benefício poderia ser estendido a condenados, que, sendo primários e de bom comportamento, teriam a progressão de regime antecipada em um ano.
— Fizemos um mapa mundial da questão prisional. Em toda a América, tem aumentado a população carcerária. A sociedade tem que buscar alternativas. O Brasil já tem uma legislação muito avançada em termos de penas alternativas. A outra opção agora é a coerção eletrônica, com o uso da pulseirinha ou da tornozeleira — disse Michels.
Vários projetos sobre monitoramento eletrônico de presos estão tramitando no Congresso, mas nenhum agrada integralmente ao governo. Michels acredita ser importante elaborar uma nova proposta a partir de experiências internacionais. Técnicos do Ministério da Justiça vão colher informações em Portugal, Colômbia e outros países onde o sistema já esteja em vigor.
A ideia é comparar e elaborar um modelo mais adequado ao Brasil. Acusados de crimes contra o patrimônio público, os criminosos de colarinho branco não seriam beneficiados.
Só com o controle eletrônico, o governo entende que poderia reduzir a quase metade o déficit de vagas (180 mil).
— Um número entre 75 mil e 80 mil presos pode cumprir pena com cerceamento eletrônico — disse Michels.
Os dados apresentados no congresso da ONU reforçaram o consenso no governo sobre o monitoramento eletrônico. Estatísticas apresentadas durante o encontro de representantes de quase todos os países indicam que o Brasil está batendo recordes de prisões. O país estaria, em termos proporcionais, superando até os Estados Unidos, que têm a maior população carcerária do planeta. De 1995 até agora, o número de detentos brasileiros pulou de 148 mil para 473 mil, ou seja, triplicou.
Neste mesmo período, o número de internos nas cadeias americanas passou de 1,2 milhão para 2,5 milhões. Os números não são pequenos, mas a situação estaria se tornando ainda mais crítica no sistema carcerário nacional. Em entrevista durante o congresso, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, admitiu que o sistema prisional brasileiro está falido. Michels sustenta que o monitoramento não implica impunidade, sendo um tipo de punição, com menor custo para o Estado.
Resistência política atrasa humanização de presídios Numa tentativa de minimizar o drama, o governo deve liberar, semana que vem, R$ 470 milhões para a construção de centros de detenção provisória, que vão abrigar 32 mil presos que hoje se amontoam em delegacias.
Segundo o Depen, a situação destes presos é, em muitos casos, mais degradante que nos presídios. As delegacias estão abarrotadas com 58 mil pessoas não condenadas, um número bem superior ao de vagas (15 mil). Mas as dificuldades não são apenas financeiras.
A humanização dos presídios tem enfrentado forte resistência política. Segundo Michels, governadores e prefeitos quase nunca veem com bons olhos a ideia de construir presídios. Por um motivo simples: isso desvaloriza terrenos vizinhos e cria sensação de insegurança. A expansão do sistema prisional esbarra ainda nas deficiências de parte dos governos estaduais e na corrupção. Alguns governos mantêm parados na Caixa Econômica Federal R$ 806 milhões destinados às obras e liberados pelo governo federal em 2004. A verba não teve utilidade prática por falta de projetos adequados, por disputas políticas ou por pendências judiciais.

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