terça-feira, 3 de novembro de 2009

PERMISSÃO PARA QUE O MP INVESTIGUE CRIMES AGRAVA CRISE COM A PF

Jornal do Brasil
03/11/2009

A polêmica questão de se o Ministério Público pode ter a iniciativa de conduzir ou realizar investigações criminais está prestes a ser decidida pelo plenário do Supremo Tribunal Federal. A expectativa é de que a Corte dê uma interpretação mais flexível ao dispositivo constitucional segundo o qual cabe à Polícia Federal “exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União”, e às polícias civis “a apuração de infrações penais, exceto as militares”. Cinco dos 11 integrantes do tribunal já têm posição firmada na linha de que o MP pode, sim, promover a investigação criminal em caráter “concorrente e subsidiário”, sobretudo em “hipóteses delicadas, nas quais pode se tornar questionável a atuação da polícia, notadamente em crimes praticados por policiais, como a prática de tortura”, segundo o ministro Celso de Mello.
Na terça-feira passada, a 2ª Turma do STF reconheceu, mais uma vez, o poder de investigação paralelo do MP, no julgamento de três habeas corpus relatados por Celso de Mello, decano do tribunal, que foi acompanhado por Eros Grau e Joaquim Barbosa – componentes da turma, juntamente com Ellen Gracie e Cezar Peluso. A ministra e Peluso não participaram da sessão. Mas Ellen Gracie já se pronunciou, em outro caso semelhante, no mesmo sentido da maioria consolidada na sua turma, assim como Ayres Britto, integrante da 1ª Turma.
Como relator de um inquérito em que o deputado Remi Trinta foi indiciado por fraudes contra o Sistema Único de Saúde, em 2004, Ayres Britto votou favoravelmente à legalidade da investigação, que fora instaurada e presidida pelo MP, quando o pleno do STF começava a analisar a o mérito da denúncia. Mas o ministro Cezar Peluso pediu vista daquele processo, que acabou por ser enviado à Justiça de primeiro grau, já que o parlamentar não foi reeleito em 2006.
A posição de Peluso é uma incógnita desde que, há mais de dois anos, também pediu vista do chamado leading case, com base no qual a questão deve ser resolvida: o habeas corpus ajuizado pela defesa de Sérgio Gomes da Silva, o “Sombra”, denunciado – com base em investigação promovida pelo MP estadual, como mandante do assassinato, em 2002, do então prefeito de Santo André (SP), o petista Celso Daniel.
O ministro Marco Aurélio é o relator desse caso-piloto e, na sessão interrompida pelo pedido de vista, em junho de 2007, votou pelo arquivamento da ação penal em curso na Justiça de Itapecerica da Serra. Para Marco Aurélio, o aditamento à denúncia contra “Sombra”, feita pelo MP estadual, em dezembro de 2003, com base em “investigação paralela sigilosa, com a indicação de um promotor para presidir o inquérito, bate de frente com os dispositivos constantes dos artigos 144 e 129 da Constituição”. No seu entender, enquanto o primeiro é “auto-explicativo”, ao atribuir às polícias civis, “dirigidas por delegados de polícia de carreira, as investigações em inquéritos penais”, o artigo 129 especifica, entre “as funções institucionais” do MP, “exercer o controle externo da atividade policial” e “requisitar diligências e a instauração do inquérito policial”.
Em seu voto vencedor na 2ª Turma, num dos julgamentos realizados na última semana, Celso de Mello rebateu a tese de que um dos incisos do artigo 144 veda a condução de investigação criminal pelo MP. Segundo ele, quando a Constituição menciona a “exclusividade” da Polícia Federal no exercício das “funções de polícia judiciária” a Carta pretende apenas “distinguir a competência da PF das funções das demais polícias”.
Prejuízo
O ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza – que se aposentou no início deste mês, depois de quatro anos na chefia do MPF – lamenta a demora do Supremo na solução da controvérsia:
Essa indefinição só está prejudicando a solução das ações penais – afirma Antonio Fernando. Sempre que se abre um contencioso incidental, com base na suposta invalidade de provas obtidas pelo MP , se desvia o foco principal das ações penais, que é decidir sobre a autoria e a culpabilidade dos réus.
O autor da denúncia do “Mensalão” explica ainda que “o MP não quer assumir o papel de polícia judiciária, mas, simplesmente, oferecer denúncias com informações suficientes para que sejam acolhidas pelo Judiciário”. E lembra que, no processo do “Mensalão” – que culminou com o recebimento da denúncia, pelo STF, contra 39 indiciados, a partir do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu.

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