sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Bope vai substituir a tradicional farda preta pela camuflada, em nome da segurança e saúde dos PMs

























Foto: Raphael Gomide

O Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) vai trocar sua tradicional farda preta, nas operações diurnas, por um moderno camuflado digitalizado verde. A mudança deve ocorrer já em 2012.

Nova farda do Bope deve ser adotada em 2012

O padrão escolhido para ser o principal uniforme da tropa de elite da Polícia Militar do Rio é o camuflado digital de florestas, usado pelos fuzileiros navais dos Estados Unidos. É considerado o mais adequado ao perfil “multitarefas” da unidade, que atua tanto nas matas próximas a favelas como no ambiente urbano.
O uniforme preto, porém, não vai ser abandonado. Continuará a ser empregado pelo Grupo de Resgate e Retomada de Reféns (GRR) e pela tropa, em operações à noite.
A substituição da farda que celebrizou o Bope vinha sendo estudada desde 2007, por motivos de segurança e de saúde dos policiais. A roupa escura, embora faça parte da mística dos “homens de preto”, paradoxalmente põe em risco a vida dos “caveiras” – como são conhecidos os “cursados” em operações especiais.
A farda negra é facilmente identificável à distância durante o dia, pelo contraste da cor com o ambiente, e até à noite, quando “faz silhueta”, expondo os PMs. Outro ponto negativo que foi levado em consideração é que a camisa e as calças pretas acumulam muito calor, sob o forte sol fluminense. Frequentemente provocam desidratação e intermação (elevação da temperatura do corpo pelo calor excessivo), com mal-estar e desmaios aos soldados.

Atual comandante do Choque, o "caveira" Fábio fez estudo sobre a nova farda

“A cor preta contrasta-se facilmente com qualquer cor à exceção dela mesma. O policial fardado de preto pode ser plotado à distância, tornando-se um alvo fácil no ambiente operacional”, afirma estudo do tenente-coronel PM Fábio Souza, para o Curso Superior de Polícia, que ajudou a embasar tecnicamente a decisão. Atualmente comandante do Batalhão de Choque, Fábio é “caveira” do Curso de Operações Especiais (COEsp) de 1996 e integrou o Bope por 13 anos, a maior parte de sua carreira.
No trabalho “Desempenho Operacional do uniforme de Combate Digitalizado nas Áreas de Risco do Rio de Janeiro”, o oficial aponta cientificamente as muitas desvantagens da farda negra em comparação com a camuflada digital.
Experiências práticas de policiais do próprio Bope com diferentes uniformes mostraram que deslocamentos feitos usando o camuflado digital retardam a visualização à distância, tanto a olho nu quanto com o auxílio de lunetas.

O atual chefe do Estado-Maior Operacional, coronel Alberto Pinheiro Neto, estava à frente do Bope em 2007 e já defendia a mudança do uniforme, ao lado do seu subcomandante, Renê Alonso, atual comandante da unidade. No novo cargo, abaixo apenas do comandante-geral, Pinheiro Neto tem mais autonomia para implantar a alteração. “Estamos trabalhando para que seja implementado este ano”, afirmou o coronel, ao iG.

“Uniforme preto é totalmente divorciado do contexto operacional”, diz trabalho

Em seu estudo, Fábio é contundente. “A utilização do uniforme de combate digitalizado em operações policiais diurnas é a opção mais recomendável para o ambiente operacional encontrado no Rio de Janeiro, em comparação ao uniforme preto usado atualmente. Os resultados (dos testes) demonstraram que o uniforme preto é totalmente divorciado do contexto operacional a que está submetido. Por outro lado, o uniforme de combate digitalizado atendeu totalmente as expectativas operacionais”.
Nem sempre os soldados do Bope se vestiram da cor preta, só adotada em 1992. Antes – desde sua criação, em 1978, como Nucoe (Núcleo de Operações Especiais) – a farda era azul marinho. A decisão de adotar a farda preta, porém, não foi embasada em nenhum estudo.
Foi baseada no uniforme do SAS (Special Air Service), tropa de elite do Exército Britânico, que invadiu a embaixada do Irã em Londres, tomada por terroristas, em 1980. Nesse caso, o uso do fardamento totalmente preto era uma arma psicológica para intimidar o inimigo, dando aos soldados o aspecto de “um ser desumano”, diz o tenente-coronel Fábio, no trabalho.
O oficial, que usou a farda por tantos anos, porém, diz que, além do ambiente operacional completamente diverso daquele no qual se inspirou, o “clima tropical” do Rio é um agravante, conjugado ao peso de equipamento. “No universo das operações policiais diurnas, o uso do uniforme preto se torna um sacrifício extra, com possíveis casos reais de desidratação e intermação. É uma emergência clínica com alto risco de morte”, afirma.

Cabo Ananias achou o uniforme novo confortável

O cabo Ananias, há 11 anos no Bope, lembra-se bem de passar mal dentro do blindado “Caveirão”, durante operação no verão, na Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha. “Estava um inferno, a bala voando, e um calor insuportável, com todo mundo passando mal dentro do blindado, sem poder sair, porque o tiro estava comendo lá fora”, lembra.

Curiosamente, apesar do uso corriqueiro e célebre, até hoje a farda preta do Bope não faz parte dos uniformes oficiais da PM.

Nunes admite que a mudança de cor pode causar estranheza, no primeiro momento, mesmo entre os policiais.

“Vai causar estranheza porque é uma marca, mas o preto não acabou. É uma ferramenta a mais para a qualidade do serviço”, disse. “Quem fez a mística do Bope não foi o uniforme, mas o combatente. E hoje o preto não é mais exclusividade nossa, até segurança do Metrô usa... Tenho de privilegiar a saúde e a qualidade do serviço, dando mais segurança e saúde física ao PM, para ele trabalhar mais tempo e melhor. Vestindo preto, amarelo ou paisano, é o Bope.

Para a farda vestir perfeitamente no soldado, o Bope vem estudando a mudança há um ano, e foi contratada a consultoria do Senai/Cetiqt, especializado em uniformes.
A modelagem foi especificada de forma tão detalhada que as especificações das gndolas (camisas) tomam 24 páginas, e as das calças, mais 26. São informações como tipo de costuras, fios e as distâncias entre bolsos, posições dos velcros, por exemplo.
O tecido a ser usado é de alta tecnologia: permite a passagem de ar, para não esquentar demais e tem resistência a fogo. Até o fim de janeiro, chegam ao Bope 60 uniformes de empresa norte-americana – que fornece material a militares dos EUA, Noruega, Itália e Austrália – para teste.

“Não tem prova melhor que a avaliação dos meus policiais, rastejando no chão e arrastando a farda nos becos”, diz o major Nunes, chefe de Logística do Bope.

A tecnologia não impede, porém, a desconfiança dos soldados do própria tropa de elite. “Farda feia para caramba!”, disse um PM. “Vai ser esta a farda?”, perguntou outro, curioso. “Uso a minha, preta, a vida toda. Para que trocar?”, questionou um terceiro.

A 10 metros de distância, o uniforme faz o PM se camuflar no mato

Já há quem fale em uma nova mística, dos “homens de verde”. “É o homem-camaleão?”, ironizou um policial, referindo-se ao cabo Ananias, que usava a roupa. Ananias, porém, aprovou. “É muito confortável, bonita e não é quente”, disse.

Os conjuntos de camisa e calça devem custar ao Bope de R$ 250 a R$ 300. Os cerca de 400 policiais do Bope vão receber dois conjuntos de camisa e calças camufladas e um conjunto de farda preta, também feito com o novo material – no total de 1.200 a 1.500 uniformes.

O orçamento já está reservado, e a licitação acontecerá nos próximos meses.

Um comentário:

  1. Aproveito a oportunidade para divulgar o livro; Uma Breve história da Policia no Brasil.

    Uma breve história da polícia no Brasil, apresenta um sucinto panorama histórico do aparato de coerção pública no Brasil desde os tempos coloniais até o final da ditadura militar. Seu principal objetivo é demonstrar que contraditoriamente ao que se espera da função policial, atividade eminentemente civil; as ações ostensivas de segurança em nosso país seguem a lógica militar de organização, em instituições muito parecidas com exércitos regionais, privilegiando o adestramento do servidor uniformizado, formando combatentes ao invés de servidores aptos ao contato direto com a comunidade. Diversas contradições relacionadas a origem social dos responsáveis pela aplicação da lei e a forte raiz oligárquica das instituições são pontuadas em todo o estudo.

    Em apenas três capítulos você conhecerá as raízes da atividade policial no Brasil, desde os primeiros esforços oficiais da coroa portuguesa em se constituir forças regulares de segurança, focadas principalmente, na resolução de problemas oriundos da sociedade escravista; as reformas oligárquicas de 1831, o processo de militarização no período republicano com a missão militar francesa na Força Pública paulista, a criação da Guarda Civil de São Paulo, as peculiaridades dos modelos civil e militar de policiamento, até a consolidação do modelo policial militarizado criado pelo regime golpista de 1964, ainda em atividade.

    http://clubedeautores.com.br/book/120489--Uma_breve_historia_da_policia_no_Brasil

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