quarta-feira, 24 de novembro de 2010

ARTIGO - Terceira Via: Um novo modelo de Polícia


* Por Dirceu Vicente Lino

O Brasil é sem dúvida um país policial, mas isso não tem garantido como deveria a segurança das pessoas. Existem 54 (cinqüenta e quatro) polícias estaduais, 3 (três) polícias federais e inúmeras guardas municipais. Que de Guarda só tem o nome. Na verdade elas já exercem atividades policiais. Sem contar as “polícias” formadas ao arrepio da Constituição como os grupos do MP. Ainda existe serviço reservado (P-2) e determinados núcleos de inteligência (interceptação telefônica) sendo usados indiscriminadamente. Por não respeitarem as normas legais que limitam o poder de ação de cada Instituição, elas acabam se imiscuindo em atividades alheias, não raro atrapalham investigações em curso dos órgãos competentes. Cada vez que isso acontece, contabiliza-se prejuízos sob todos os aspectos. Isso demonstra o quanto o Estado está desorganizado e vulnerável no enfrentamento ao crime. É possível que determinada pessoa possa estar sendo investigada (monitorada) simultaneamente por vários desses órgãos, tamanha é a desorganização em que se encontra o Estado segurança pública. A integração ordenada de órgãos públicos é legal e bem vinda. A superposição e até a usurpação de funções é ilegal, fere o estado democrático de direito, escancara a vulnerabilidade do Estado brasileiro e contribui para insegurança pública. O método da unificação das polícias civil e militar já foi tentado e fracassou, por ser traumático às polícias, ser obrigatório e não oferecer período de transição para adaptação. Aliado a isso está em jogo à vaidade pessoal de parte dos oficiais militares e das autoridades policiais, que vêem as Instituições a que pertencem mais como um patrimônio seu, do que um instrumento do Poder Público a serviço da sociedade. Esse corporativismo sentimental pode até parecer sadio, mas não pode ser mais importante do que o interesse social. A Terceira Via é democrática porque criam num primeiro momento 27 (vinte e sete) polícias estaduais, para substituir as atuais 54 (cinquenta e quatro) polícias civil e militar, mas oferece aos seus membros a faculdade de migrarem para essa nova polícia em condições mais favoráveis profissionalmente. A Terceira Via não obriga os militares estaduais se desmilitarizarem, pelo contrário, oferece àqueles que queiram a oportunidade de fazê-los, sem perder a característica de polícia ostensiva, haja vista, que a nova polícia estadual continuará em sua maioria uniformizada, realizando o policiamento preventivo. A nova polícia será composta de ex-policiais civis e militares, e daqueles que nela ingressarem diretamente, com atribuições de polícia ostensiva e de polícia judiciária. Os militares e os policiais civis que não aderirem à nova polícia estadual permanecerão em seus cargos até a aposentadoria. Os próximos concursos serão direcionados somente para a nova polícia estadual que terá carreira única. A Carreira Única representará grande avanço na profissionalização das polícias brasileiras. Isto porque atualmente só os Delegados de Polícia e os Oficiais militares são plenamente profissionais, porque apenas esses vivem de suas profissões. Os investigadores, escrivães e as praças militares são obrigados a exercerem atividades paralelas (bicos) para complementar seus subsídios. Não se pode admitir que a imensa maioria dos policiais brasileiros não recebe salários compatíveis com suas atividades. A polícia estadual calcada na Carreira Única acabaria com esse abismo ora existente entre o ápice e a base da Instituição Policial. Na nova polícia não haverá ingresso de autoridade policial. O ingresso na carreira ocorrerá apenas nas classes dos policiais e galgar o cargo de autoridade policial dependerá de concursos públicos internos para policiais que preencherem os requisitos legais. É notória a dificuldade que o governo enfrenta para fazer concurso visando zerar o déficit de efetivo das polícias. Basta citar como exemplo os Delegados de Polícia, que no ano de 2006 deveriam ter 400 Delegados. Atualmente esse número seria bem maior, mesmo assim o Estado tem apenas 200 Delegados de Polícia. Destes, mais de 30 já adquiriram o direito à aposentadoria, elevando o déficit para cerca 250 Delegados. Mesmo que o governo adote uma política de inclusão de 50 Delegados de Polícia ao ano, levaria de 6 a 8 anos para o Estado oferecer à sociedade um número de Delegados próximo do mínimo necessário. Esse exemplo também se aplica ao Investigador e ao Escrivão de Polícia. Ou seja, a toda Polícia Judiciária e provavelmente às demais forças de segurança pública. Se a Terceira Via já estivesse em vigor o governo poderia sanar déficit da polícia estadual imediatamente, com um custo-benefício infinitamente menor. Bastaria à adesão de Oficiais militares ao cargo de Delegado de Polícia. A adesão de praças militares aos cargos de Escrivão e Investigador de Polícia e abrir concursos para as carreiras policiais que formam a base da nova Polícia Estadual. A Terceira Via, além de redefinir as atribuições das polícias, tem por objetivo compatibiliza-las com o regime democrático que o País atravessa. Numa democracia consolidada a polícia que protege o cidadão não deve ser a mesma que o reprime, não raras às vezes com violência, quando de sua reivindicação trabalhista, ou em manifestação social. No atual modelo, torna-se paradoxal a policia cidadã, a polícia comunitária, a integração da polícia com a sociedade, a polícia trabalhando em programas sociais, quando a sociedade não pode confiar plenamente na polícia que tem. É importante distinguir a polícia que protege a sociedade da polícia que defende o Estado. Outras vantagens da Terceira Via: direção única, mesma formação profissional, o mesmo padrão de atendimento à sociedade, não sofrer solução de continuidade na investigação, nem na prevenção, eliminar os conflitos de atribuições, eliminar o enfrentamento hostil entre as Instituições policiais, reduzir a burocracia na cadeia de comando, otimizar a força de trabalho, aumentar a eficiência e a qualidade, modernizar a segurança pública, conquistar a confiança da sociedade, etc. A nova polícia estadual poderia comportar os seguintes Cargos de Autoridade Policial: Delegado de Polícia Judiciária; Delegado de Polícia Operacional. Os Cargos de Agentes e Auxiliares de Autoridade Policial: Escrivão de Polícia; Investigador de Polícia; Agente de Polícia Ostensiva, etc.
* Dr. Dirceu Vicente Lino é Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia de Mato Grosso. E-mail: dr.dirceu@amdepol.com.br

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