quinta-feira, 8 de abril de 2010

EM PRIMEIRO LUGAR, O TRÁFICO

Carta Capital

Representa 60% do faturamento total da multinacional do crime
Stendhal, tomado em 1799 por impulsos proféticos, vaticinou o nascimento na Calábria de uma perigosa sociedade secreta. Estudioso das coisas da Itália, onde viveu por muito tempo, o autor de O Vermelho e o Negro e A Cartuxa de Parma, percebeu o desfecho inevitável de situações vincadas pela miséria e pela violência. De fato, a origem da ‘Ndrangheta remonta aos começos de 1800.
O nome vem de uma palavra do grego antigo, andraghetos, que significa homem corajoso, coerente com reminiscência dos tempos em que a Baixa Itália foi Magna Grécia, terra de Pitágoras e Arquimedes. Segundo a polícia italiana, atualmente militam na ‘Ndrangheta 155 clãs locais, ‘ndrine, com cerca de 6 mil filiados.
Na Península, pela qual se espalhou até as cidades principais do norte, controla setores da indústria, finanças, comércio, agricultura, amiúde com a conivência de administrações locais e regionais. De todo modo, o tráfico de drogas é o item principal de faturamento de 44 bilhões de euros em 2008 (acima de 27 bilhões, do total de 44). Segundo o professor Donato Masciadaro, da Universidade Bocconi de Milão, o faturamento seria ainda superior, chegaria a 55 bilhões de euros, pois teriam de ser acrescentados os ganhos com a reclicagem de dinheiro.
Maior organização mafiosa do mundo, a ‘Ndrangheta atirou seus tentáculos mundo afora a partir do tempo da emigração calabresa, que em vários casos estabeleceu espécies de cabeças de ponte, como a Mano Nera nos Estados Unidos, no começo do século passado. Como multinacional do crime, opera em 49 países. No Brasil, há tempo atuam em Fortaleza as ‘ndrine dos Mazzaferro e dos Morabito. Estes estão igualmente na Argentina e na Colômbia. Aqueles também, e ainda em Curaçao. Mas a invasão do Brasil já alcança muitas outras cidades além da capital do Ceará, a começar pelo Rio e por São Paulo.
As ‘ndrine estão ligadas por decisivos vínculos familiares e é bastante comum o casamento entre representantes de ‘ndrine diferentes. A filiação se dá por nascimento, quando se trata do filho de ‘ndranghetista, ou pelo batismo, que implica o juramento “em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo”. O padrinho garante a lealdade do batizado com a própria vida, e por qualquer deslize deste pode pagar também a família. Esta é a primeira razão pela qual colaboradores de Justiça saídos
da ‘Ndrangheta são muito raros. Uomo di panza, homem de barriga, e capobastone, chefe do bastão, são alguns dos nomes que designam figuras do comando, e todos são uomini d’onore, homens honrados.

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