terça-feira, 30 de março de 2010

PENA PARA TRAFICANTES DIVIDE SUPREMO

Jornal do Brasil

Luiz Orlando Carneiro
O Supremo Tribunal Federal está prestes a decidir se são ou não constitucionais dispositivos da Lei de Drogas (Lei 11.343/06) que proíbem a conversão da pena de reclusão em pena restritiva de direitos (alternativa) para quem, de algum modo, participa do tráfico de qualquer tipo de droga. O ministro Ayres Britto – relator de habeas corpus ajuizado pela Defensoria Pública da União em favor de um condenado a um ano e oito meses de prisão por portar 13,4 gramas de cocaína – já votou pela inconstitucionalidade dos artigos 44 e 33 (parágrafo 4º) da lei de agosto de 2006. A seu ver, mesmo equiparado aos crimes hediondos, o tráfico ilícito de entorpecentes não pode ser punido sem que o juiz observe o inciso 45 do artigo 5º da Constituição (“cláusula pétrea”), segundo o qual “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: privação de liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e interdição de direitos”.
O caso – que vai servir de paradigma para a fixação definitiva da jurisprudência do STF sobre a questão – começou a ser julgado no último dia 18, mas o ministro Joaquim Barbosa pediu vista. Em fevereiro de 2006, por 6 votos a 5, o plenário da Corte decidiu que autores de crimes hediondos têm direito à progressão da pena (regime semiaberto e até aberto), se o juízo de execução considerar que tenham demonstrado comportamento e claras intenções de regeneração e reintegração social. Mas a decisão - tomada num processo em que o réu era o cantor evangélico Oséas Campos, condenado a 12 anos de reclusão por crime de atentado violento ao pudor, cometido contra três crianças – foi anterior às modificações que sofreram as antigas Lei de Drogas e Lei dos Crimes Hediondos, esta última atualizada por leis de 2007 e 2009.
Naquela ocasião, votaram a favor da possibilidade de progressão da pena em crimes hediondos e equiparados os ministros Marco Aurélio (que era o relator), Ayres Britto, Eros Grau, Cezar Peluso, Gilmar Mendes e Sepúlveda Pertence (cuja vaga é hoje ocupada por Dias Toffoli). Ficaram vencidos Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello, Carlos Velloso (sucedido por Ricardo Lewandowski) e Nelson Jobim (sucedido por Cármen Lúcia). No próximo julgamento sobre o benefício da conversão da pena para crimes de tráfico de drogas, em face da nova lei de 2006, sabe-se que Marco Aurélio entende ser ela constitucional, e deve aderir à antiga minoria – juntamente com Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Celso de Mello.
Assim, o ministro Ayres Britto – no caso específico dos óbices da nova Lei de Drogas ao direito de converter em pena alternativa a prisão prevista para condenados – espera que o voto por ele proferido seja acompanhado pelos que foram mais liberais e menos “legalistas” no julgamento de quatro anos atrás, quando ainda vigorava a Lei 8.072, que estabelecia o regime totalmente fechado para o cumprimento de penas por qualquer tipo de crime hediondo. E pelos que sucederam os já aposentados.
Decisão recente sobre liminar ilustrou racha entre ministros
A redação da nova Lei dos Crimes Hediondos (Lei 11.464/07) não admite mais a discussão sobre a admissão da progressão do regime prisional, já que o novo parágrafo 1º do artigo 2º dispõe que a pena por esses crimes será cumprida “inicialmente” em regime fechado.
O ministro Ayres Britto, contudo, usa tal argumento para fortalecer o seu ponto de vista sobre a liberdade que deve ter o juiz da execução para também substituir – mesmo nos crimes hediondos – a pena de reclusão por restritiva de direitos, como a “prestação social alternativa”. Para ele, “uma coisa é a lei estabelecer condições mais severas para sua aplicação, mas outra coisa é a lei proibir, secamente, a transformação da pena supressora ou constritiva da liberdade em pena restritiva de direitos”.
Britto ressalva que o seu voto não alcança a proibição de que os apenados pelos crimes previstos na Lei de Drogas possam obter “sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória”, mas se refere, tão somente, à declaração de inconstitucionalidade da vedação da conversão da pena de reclusão em pena alternativa.
O STF, no entanto, está dividido quanto à matéria. Ainda na última semana, em despacho individual, a ministra Ellen Gracie, ao negar liminar em habeas corpus a um acusado de tráfico de drogas que pretendia liberdade provisória, frisou que a nova Lei de Drogas proíbe “expressamente”, não só a concessão de liberdade provisória mas também a conversão das penas privativas de liberdade em penas alternativas.
O que dizem os dispositivos da Lei de Drogas
Artigo 33:
Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de cinco a 15 anos e pagamento de 500 a 1.500 dias-multa.
Parágrafo 4º:
Nos delitos definidos no caput (…) deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, VEDADA A CONVERSÃO EM PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
Artigo 44:
Os crimes previstos nos artigos 33, caput (…) são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, VEDADA A CONVERSÃO DE SUAS PENAS EM RESTRITIVAS DE DIREITOS.

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