segunda-feira, 3 de agosto de 2009

USO DE DROGAS E CRIMINALIDADE URBANA


MÁRCIO MOTHÉ FERNANDES
Promotor de Justiça, Mestre em Direito Penal e
Coordenador de Justiça Terapêutica do MP/RJ



Nos últimos meses, o país tem assistido a uma sucessão de crimes que têm em comum a utilização de drogas como causa predominante para a sua ocorrência. Somente numa mesma rua do bairro Bancários, na Ilha do Governador, neste ano, dois crimes chocaram a população:
No dia 02 de janeiro, estando completamente alucinado por causa de drogas, o adolescente A.D.F. matou a avó com setenta facadas porque ela havia tentado impedi-lo de vender um liquidificador para ser trocado por cocaína. No dia 17 de abril, a aposentado Paulo César da Silva, 62 anos, matou a tiros o seu próprio filho, Paulo Eduardo Olinda da Silva, 28 anos,
após ele ter jogado uma televisão pela janela e que seria vendida para ser trocada por entorpecentes. Em Volta Redonda, no dia 30 de janeiro, o adolescente B.S.C, 16 anos, matou a avó Tereza Lucas da Silva Costa, devido a uma crise de abstinência. A vítima teve a cabeça decepada e jogada no Rio Paraíba. Na Bahia, no dia 31 de janeiro, o vigilante Elias
Gonçalves, 41 anos, matou o filho Eliosvaldo Santos Gonçalves, 21 anos, pois não agüentava mais assisti-lo roubando a vizinhança para comprar drogas. Em São Paulo, no dia 30 de março, Amador Cortellini, 68 anos, após ter sido ameaçado de morte pelo filho Rodrigo André Cortellini, 26 anos, acabou matando-o com um tiro no peito.
Todos esses lamentáveis episódios esquentam a discussão da política de atendimento ao usuário de drogas, em especial nesse momento de intensa criminalidade e violência urbana, decorrente do alto nível de organização criminosa que alcançou o narcotráfico, patrocinado, como se sabe, pelos usuários de drogas.
Mas afinal, será que a sociedade, que tem sido impedida muitas vezes de trabalhar e se divertir, assistindo a pontos turísticos sendo metralhados, o funcionamento normal do comércio sendo interrompido, tudo por ordens de traficantes, alguns já dentro das penitenciárias em tese de segurança máxima, será mesmo que o povo suportaria os efeitos da descriminalização?
Vale ressaltar que onde ocorreu algum tipo de liberação de drogas, como na Holanda e na Suíça, o consumo aumentou demasiadamente.
O direito não é inerte e embora numa velocidade aquém da desejada, vai aos poucos se adaptando aos anseios da sociedade. Se por um lado os fatos evidenciam não ser este o momento mais oportuno para tratar da descriminalização das drogas, a Justiça vem cumprindo o seu papel e tem tratado o dependente como paciente, merecedor de um tratamento terapêutico, voltado para o abandono do vício.
As leis já se encontram adaptadas para tratar o usuário de drogas como um doente, e não simplesmente como um criminoso, conforme inveridicamente se critica por aí na equivocada tentativa da descriminalização.
Hoje já é possível que o réu primário tenha o seu processo suspenso durante o tratamento e, ao final, seja contemplado com a extinção da punibilidade e conseqüente manutenção do status de limpeza de sua folha de antecedentes. Caso já seja condenado, também poderá ter o processo
interrompido e se conseguir vencer a dependência, também terá a sua punição extinta.
Enquanto se discute a descriminalização, como se percebe, e isso não vem sendo divulgado, o Brasil já adotou a despenalização, tanto assim que já transformou o uso de drogas em crime de menor potencial ofensivo passível de uma série de benefícios previstos em lei.
Mas a verdade é que cada vez menos os usuários têm sido presos por porte de drogas e, conseqüentemente, a Justiça pouco tem podido agir, até porque o sistema criminal está totalmente atrelado a atividade policial. Se a polícia não prende, o caso simplesmente não chega até a Justiça. Em todo o Rio de Janeiro, na única Vara de Execuções Penais, onde funciona uma central de penas alternativas, menos de vinte pessoas processadas por uso de drogas participam do Projeto de Justiça Terapêutica, criado desde setembro do ano passado.
Já tarda a hora da implementação de uma política responsável do tipo da tolerância zero ou da broken windows que conseguiu reduzir significativamente a criminalidade em Nova York.
Todos se lembram da frase do então chefe de Polícia Civil do Rio de Janeiro, aliás do mesmopartido político do atual governo federal, aduzindo que “Ipanema brilha à noite”. A propósito,quantas pessoas são apresentadas pela polícia ao Ministério Público, por cheirar cocaína oufumar maconha na Zona Sul? Quantas operações já foram deflagradas para coibir o uso desenfreado de drogas nas raves tão em moda ?
A gravidade do problema tem demonstrado que já não há espaço para uma singela política de redução de danos e de riscos. As famílias também de classe média estão se matando a cada dia.
O que parece incrível é que a prisão pode funcionar como um fator motivador para o tratamento. Se a família perdeu o controle, o Estado deve intervir, até porque acima da liberdade individual de cada um, está o bem-estar da coletividade. Neste diapasão, hoje é perfeitamente possível a desejada aproximação entre a justiça e a terapêutica. A modernização
do processo já não mais admite a participação exclusiva dos juízes e promotores julgando e fiscalizando o cumprimento das leis.
Mundialmente, há uma forte tendência à inclusão de uma equipe de assessoria interprofissional, formada por médicos, assistentes sociais, psicólogos e
outros profissionais, indispensável para a solução adequada dos conflitos. Não dá mais para tratar da utilização de drogas com hipocrisia, na medida em que pessoas de classe média continuam adquirindo drogas até mesmo por telefone e vêm se matando todos os fins de semana nos bairros mais nobres da cidade, em chocantes acidentes de trânsito, a grande maioria decorrente da utilização de drogas lícitas e ilícitas. Isso sem falar em outros efeitos negativos da utilização das drogas, sendo fato já costumeiro em que, preocupadas com os problemas de queda de produtividade decorrentes do uso de álcool e drogas ilícitas, as empresas têm aplicado testes de bafômetro e de exames de urina em seus funcionários.
Quando há indícios de dependência, a própria empresa muitas vezes custeia o tratamento, quando não opta, na maioria das vezes, pela demissão.
A lei da ação e da reação funciona da seguinte forma: cada grama de maconha ou cocaína adquiridos representam mais dinheiro para os traficantes, que adquirem armas
pesadas, corrompem profissionais de diversos escalões e, sobremaneira, acabam de vez com a segurança pública. É preciso adotar uma política educativa responsável.
Até quando um segmento da sociedade vai defender que o usuário deve se drogar, destruir a sua própria vida, de seus familiares e de toda a sociedade, até que resolva parar por conta própria? Quantas famílias ainda precisarão ser destruídas ou quantas pessoas ainda terão que morrer ?
A Justiça Terapêutica, que vem logrando êxito em outros países, parece ser a saída, onde a intervençãoda equipe multiprofissional do Judiciário pode contribuir em definitivo para o abandono do vício. A liberdade de cada um sempre esbarrou no cumprimento da lei, voltada para garantir a saúde, a ordem e segurança pública em prol da paz social. O combate ao uso e ao tráfico de
drogas constitui uma questão de resgate à cidadania, um dever do Estado e de todo cidadão.

4 comentários:

  1. Meu colega, parabéns pela iniciativa, sou da carreira e sei da deslealdade que sofremos, te desejo forças e muito boa sorte, pois devemos ter um canal de discussões sobre nossa carreiras assim.

    Já estou divulgando-o nas comunidades policiais, as quais faço parte no orkut.

    Att.
    Fernando

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  2. E o mundo estar cadaves mais violento temos quer ter cuidado

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  3. Amigos a droga vai destruir a nossa sociedade, não vai sobrar pedra sobre pedra.A situação é grave até mesmo no interior.O que será de nossos jovens no futuro? Zumbis improdutivos vivendo a custa da familia ou de furtos? assassinos de pai, mãe e irmãos? Tenha santa paciência! Ainda tem autoridade judicial defendendo lei mais branda? O dia que o filho deles, a mãe deles forem mortos por um puto desses no sinal de trânsito ou no interior de suas casas tenho certeza que eles mudam de opiniâo.É quase certo que isso vai acontecer com eles.Tenho ódio dessa justiça frouxa com o tráfico.Deus me perdoe!

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  4. Sou a favor da Justiça Terapeutica, no entanto, não basta só Justiça Terapeutica temos que eliminar a fonte de onde o usuário sacia esse vicio maldito, que é o uso de drogas.Não podemos nos conformar com o discursso hipocrita e demagogo cheio de palavras bonitas mas de resultados ineficientes.O rigor na educação para os jovens deve começar em casa no seio da familia independente de serem familias humildes, ricas ou pobres, sem essa que o jovem pobre sem oportunidades vai ser usuário de drogas ou bandido, pelo contrário o jovem que que se vê obrigado a trabalhar e estudar tem se revelado os melhores profissionais os melhores empreendedores.Sendo assim, é necessário acabar com a fonte do mal que é o trafico de drogas, que acaba com a saúde dos usuários e com as suas familias.Não pode haver pena branda para traficantes sob pena do Estado perder o controle da ordem pública.

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